16/04/2018 - O Globo
Numa cerimônia que contou com a presença de Dom Pedro II, em
30 de abril de 1854, Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, botou o
Brasil nos trilhos. Era a inauguração da primeira ferrovia do país, em Magé,
que ligava o porto de Mauá, no fundo da Baía de Guanabara, a Fragoso, em Raiz
da Serra, a 14 quilômetros de distância.
A festa apresentou ao monarca e aos moradores da região a
maria-fumaça Baronesa, primeira locomotiva do Brasil. Ela partiu da pequena
estação Guia de Pacobaíba, que foi desativada na década de 1960 e vem
protagonizando histórias bem menos glamourosas nos últimos 50 anos. Passou por
várias tentativas de revitalização, já foi invadida, teve as portas arrombadas,
virou depósito de lixo e hoje está fechada, com telhado quebrado e marcas de
pichação.
Agora, um acordo firmado entre a prefeitura de Magé e o
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) poderá ser,
enfim, a partida para um novo destino.
ESTAÇÃO POUCO VALORIZADA
Em março, o órgão federal concedeu ao município o direito de
usar e administrar o complexo, que inclui a antiga casa dos agentes
ferroviários, o terreno e o trecho tombado da ferrovia Mauá-Fragoso. O espaço
terá, obrigatoriamente, que ser usado com finalidades culturais. Apesar da
importância histórica, Guia de Pacobaíba nunca foi valorizada pelo município.
Com exceção da inscrição na entrada do distrito, não há placas ou qualquer
outra sinalização indicando o caminho até a estação, de onde se tem uma bela
vista das ilhas de Brocoió e Paquetá.
Numa das muitas tentativas de revitalização, a área ganhou
um paisagismo com coqueiros e palmeiras, que nos fins de semana atrai moradores
para piqueniques e passeios de bicicleta. Do lado de fora, capim alto, muito
entulho e uma réplica de locomotiva arranhada e enferrujada completam o cenário
de descaso. Sobraram poucos metros dos antigos trilhos. Um pequeno carrinho
usado na ferrovia, coberto de ferrugem, também foi esquecido por lá.
O edifício da antiga casa dos agentes ferroviários, de 1916,
está em pior estado: foi arrombado e depredado. O antigo cais (no passado, os
passageiros vinham de barca e ali pegavam o trem) também se encontra em péssimo
estado.
O trecho ferroviário de Mauá para Fragoso, onde fica a
estação, foi considerado Monumento Histórico Nacional e tombado pela antiga
Secretaria de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 1954, no centenário
da inauguração da ferrovia. De acordo com a Associação Ferroviária Trilhos do
Rio, há registros de que a estação atual foi aberta em 1896, quando houve uma
grande reforma no porto. Outra mudança foi a do próprio nome, em 1945: de
Estação de Mauá, passou a ser chamada de Guia de Pacobaíba. Em 2007, esse patrimônio
foi transferido para o Iphan, assim como todo o espólio da extinta Rede
Ferroviária Federal Sociedade Anônima com valor histórico.
Segundo Jeanne Crespo, responsável pelo patrimônio
ferroviário do Iphan, a cessão de uso para Magé tem prazo de cinco anos,
prorrogáveis pelo mesmo período, e apresenta como principal condição a
instalação de um espaço “com fins culturais que valorizem a memória da
ferrovia”.
— Ainda está sendo elaborado pela prefeitura um plano de
gestão do bem tombado. Tudo será feito sob supervisão do Iphan — diz Jeanne.
A missão de criar um novo projeto para a Guia de Pacobaíba
foi dada à secretária de Educação e Cultura de Magé, Alisson Brandão, que
pretende fazer do local um ponto de memória, voltado para o turismo. O espaço
será aberto ao público e terá guias, que já passam por treinamento. Além disso,
um dia da semana será reservado para a visita de estudantes da rede pública,
acompanhados por historiadores.
Segundo a secretária, devido à falta de recursos, a
prefeitura optou por uma intervenção simples, que inclui restaurar os dois
prédios, melhorar a iluminação (parte da fiação foi furtada), limpar o terreno
e implantar um pequeno centro cultural. Inicialmente, o Iphan apresentou a Magé
o projeto de um parque.
— Não teríamos condições de executar a ideia do Iphan. Em
maio, vamos começar a reforma do telhado. A previsão é que, em julho, possamos
reabrir o espaço — disse Alisson.
EM DEFESA DA FERROVIA
Para o pesquisador Antonio Pastori, presidente da Associação
Fluminense de Preservação Ferroviária, a estação deveria ser reativada:
— Reabrir como centro cultural é melhor do que deixar
fechada. Mas acreditamos que o melhor seria retomar a atividade ferroviária por
lá. Ela é um ícone e, por isso, deveria ser preservada. Nosso projeto é a volta
da viagem a Petrópolis, como fazia o imperador. Ele vinha pela Baía de
Guanabara de barca, pegava o trem em Guia de Pacobaíba, ia até o pé da serra de
Petrópolis, e de lá subia numa cremalheira por 25 minutos. O trajeto era feito
em duas horas. Restabelecer essa rota não é só resgatar a memória, é melhorar a
mobilidade urbana de Magé.
-Fonte:
https://oglobo.globo.com/rio/primeira-estacao-ferroviaria-do-pais-em-mage-sera-revitalizada-22592849
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