05/08/2019
person G1
Há sete anos a Linha Sul do Metrô de
Fortaleza (Metrofor) entrou em funcionamento. Isto, após quase 13 anos de
obras. Hoje, a linha que liga a capital a Maracanaú, na Região Metropolitana, é
a maior via de transporte de passageiros sobre trilhos em operação no Ceará,
tanto em extensão como em quantidade de usuários. Entre 2015 e 2018, o aumento
dos embarques foi de 84%, passando de 4,6 milhões para 8,6 milhões. A situação
da linha reflete justamente os dilemas do transporte metroferroviário em
Fortaleza, que, apesar de bem avaliado por quem usa, ainda padece com o ritmo
lento de expansão e oferta integral dos serviços.
Apesar da expansão de 84% no número
de usuários, a linha transporta por mês 34 mil passageiros, o equivalente a
9,7% do projetado em 2012, quando o metrô entrou em operação. A estimativa era
de que 350 mil passageiros fossem transportados por mês caso o sistema
metroferroviário estivesse operando totalmente, com a Linha Oeste e o VLT, e
integrado a outros modais, como ônibus.
O presidente do Metrofor, Eduardo
Hotz, considera essa quantidade "um avanço significativo" e reitera
que o número estimado de transporte de 350 mil pessoas por dia seria possível
se, além da Linha Sul completamente estruturada, as linhas Oeste, Leste e o VLT
já estivessem em funcionamento pleno.
"Eu não avalio como um problema,
embora a primeira vista seja 10% do que havia sido citado, porque na realidade
o nosso sistema está operando com marcha à vista, isto é, sem sistemas
automatizados, porque eles não acabaram de ser implantados. A nossa previsão
era conseguir fazer essa implantação até o fim do ano e ainda continuamos com
essa pauta. Se isso acontecer nós estaremos em condição de dobrar a frota e
reduzir pela metade o intervalo entre os trens, portanto estarei oferecendo um
serviço de muito melhor qualidade", afirma.
Eduardo também garante que não
"há decepção com esse processo", porque ele depende da liberação de
recursos. "Nós sabemos que o metrô de Fortaleza tem sofrido com a
liberação de recursos sendo feita de maneira não sistemática e abaixo do que
estava previsto nos contratos originais por conta da dificuldades financeiras
que passou o governo federal, e os próprios cuidados que eram necessários o
governo estadual ter pra fazer as suas despesas".
Ele avalia que, embora a operação
tenha déficits, ainda é bastante consistente em relação aos outros projetos.
"A nossa demanda hoje é de 34 mil. Quando começamos esse processo, não
tínhamos 5 mil ou 6 mil passageiros por dia. Isso é positivo porque traz não
apenas uma receita adicional como também oferece às pessoas uma confiança de
que o metrô está andando".
Intervalo entre as
viagens gera queixas
Entre os usuários as queixas
referem-se, sobretudo, ao intervalo de tempo entre as composições. Os 20
minutos de espera na Estação da Parangaba poderiam ser reduzidos, projeta a
técnica de enfermagem Amanda da Silva, mas ela reconhece que de forma gradual o
intervalo entre um metrô e outro tem diminuído. Há mais de dis anos, a Linha
Sul é prioridade em seu deslocamento entre Maracanaú e Fortaleza.
O faturista Michel Platini, morador da
Região Metropolitana, compartilha da percepção. Dos sete anos de abertura da
Linha Sul, há seis ele usufrui do modal para chegar ao trabalho no Bairro
Parangaba, em Fortaleza. Sai de casa às 6h e retorna às 17h. Trajeto rápido,
que caso fosse de ônibus levaria cerca de duas horas. "É um transporte
muito bom, mas se tivesse menos intervalo seria melhor. Tem vezes que está tão
lotado que não tem nem como a gente subir", desabafa.
O presidente do Metrofor ressalta que
a perspectiva é garantir recursos para que até março de 2020 o metrô esteja
automatizado. O que poderá reduzir o intervalo das viagens e aumentar a frota
uma vez que haverá mais segurança da sinalização. "Isto é, eu posso
reduzir o intervalo para a metade. Com isso, posso dobrar a minha frota, porque
terei mais segurança para colocar mais trens operando. Hoje opero com cinco
trens e passarei a operar com dez quando tiver o sistema de sinalização. A
oferta de lugares será não apenas maior do ponto de vista de quantidade como
muito maior do ponto de vista da qualidade. Hoje tenho de 16 a 17 minutos,
terei algo em torno de sete minutos e meio a oito minutos, que facilita muito a
vida das pessoas".
Integração
necessária
Uma das premissas para otimizar a
expansão do transporte sobre trilhos é não vê-lo como "concorrente de
algum outro sistema, sobretudo transporte público por ônibus", alerta o
professor de Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC),
Bruno Vieira Bertoncini. De acordo com ele, a não integração da rede metroferroviária
com os ônibus e bicicletas é um elemento que prejudica o desempenho do sistema,
bem como a mobilidade urbana. Um dos exemplos é a ausência de políticas para
transporte de bicicletas nos vagões ou mesmo de bicicletários nas estações.
Além disso, o traçado da linha
passando por áreas pouco adensadas de população, ou de comércio, pode
comprometer a atração do modal e provocar um efeito de concentração de viagens
em momentos bem definidos do dia e gerar ociosidade em outros períodos.
"Uma quantidade de passageiros transportada por dia muito abaixo da
capacidade do sistema pode ser ruim, não apenas para o equilíbrio financeiro do
mesmo, mas também para outros aspectos, como manutenção do nível de serviço do
sistema. Contudo, a demanda dependerá da existência de atividades ao longo do
corredor, bem como da possibilidade de integração com os demais componentes da
oferta de transportes".
Tarifas não pagam
operação
Na Linha Sul, as tarifas são R$ 3,60
a inteira e R$ 1,80 a meia. Mas os valores pagos pelos usuários não custeiam
nem as operações e nem a manutenção da linha. Essa situação, explica o
conselheiro da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre
Trilhos (ANPTrilhos), Conrado Grava de Souza, é comum nas operações do
transporte público sobre trilhos. Conforme o professor Bruno Bertoncini,
"seria inviável repassar tais custos para o valor da tarifa, pois ficaria
muito cara".
O representante da ANPTrilhos também
destaca que poucos sistemas pesados de metrô público do mundo são
autossuficientes. Um exemplo é o sistema de São Paulo, que paga o próprio custo
operacional. "Se você tiver um bom planejamento e diminuir a ineficiência
do sistema, consegue manter. Mas sequer tem condições de ampliar", pondera
Souza.
O G1 solicitou ao Metrofor os custos
mensais de cada linha em operação, mas até a publicação desta matéria não teve
resposta. Uma das alternativas avaliadas pelo Metrofor, segundo o presidente do
órgão, Eduardo Hotz, é a exploração de receitas não tarifárias, como o aluguel
de boxes nas estações. Isto pode acrescer entre 15% e 20% da cobertura de
custeio das linhas.
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