Jornal do Brasil Renan Almeida
Os sérios problemas de mobilidade e a deficiência no sistema de transporte público, segundo os especialistas na área, é que fazem com que os moradores de Niterói, Região Metropolitana do Rio, a cada dia percam mais horas no trânsito da cidade.
Apesar da especulação imobiliária em ritmo acelerado e perceptível a olho nu, estes especialistas não a responsabilizam pelo caos no trânsito. A tendência de crescimento vertical – e desordenado - derrubando as antigas casas para dar lugar aos novos prédios é, quando muito, vista como como uma "gota d'água" em um problema maior, como definiu o engenheiro Gilberto Gonçalves, da Universidade Federal Fluminense (UFF).
No bairro de Santa Rosa, inventaram a localidade de Jardim Icaraí - entre a Avenida Roberto Silveira e a Rua Santa Rosa -, para atrair investidores no mercado imobiliário. Também a Região Oceânica tem atraídos novos lançamentos das construtoras.
Segundo o Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis do Rio (Secovi-Rio), o aumento das construções no Jardim Icaraí, na última década, foi de cerca de 70%. Um exemplo é a Rua Erotides de Oliveira, onde há quatro anos só havia um prédio, de esquina. Hoje, ela foi tomada por um condomínio de prédios residenciais com 19 andares, totalizando 160 apartamentos. Das antigas casas, restam apenas quatro.
Em 2010 a justiça determinou, após ação civil pública, que a prefeitura de Niterói suspendesse a construção de empreendimentos imobiliários de grande porte(com mais de seis pavimentos) nos bairros Jardim Icaraí e Icaraí até que o Plano Urbanístico Regional (PUR) fosse revisto.
Na decisão, a juíza Perla Lourenço, da 6ª Vara Cível de Niterói, ressaltou que a exploração imobiliária no Jardim Icaraí “vem gerando impacto notável no trânsito e na prestação dos serviços públicos, que não acompanharam o crescimento populacional”. A decisão, no entanto, foi suspensa pelo então presidente do Tribunal de Justiça, Luiz Zveiter.
O promotor Luciano Mattos, autor da ação civil pública, explica que o PUR foi aprovado em 2002 e deveria ser revisto após cinco anos, mas até hoje isso não aconteceu.
“Nós tentamos paralisar novas construções enquanto não se fazia a revisão do PUR. Até hoje não foi revisto, deveria ter sido feito em 2007. Quando for feito já não haverá mais nada a ser revisto”.
O promotor adverte que a região está praticamente saturada e que a construção de novos edifícios tem como resultado a piora no trânsito, na circulação e nas questões de vizinhança: “Basta percorrer sua pequena extensão para constatar os inúmeros prédios residenciais em construção, como também as suas ruas estreitas e sua posição geográfica”
Falta infraestrutura
Na Região Oceânica a explosão imobiliária é também muito visível. A construção de edifícios de até quatro andares foi liberada. Desde então, o visual do local se transformou com a subida de centenas de prédios onde só havia casas. Por outro lado esse crescimento não foi acompanhado por melhorias em infraestrutura.
Um levantamento feito em maio deste ano pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional mostra que 47,25% das ruas da região oceânica não possuem pavimentação e drenagem. O resultado, explica o presidente do Conselho Comunitário da Região Oceânica, Guilherme Flach, são diversos pontos onde os alagamentos são constantes:
"A Região Oceânica não tem drenagem, quando chove tem diversos pontos crônicos de alagamento no Engenho do Mato, Itaipu e Piratininga".
Guilherme Flach, critica o crescimento desordenado em vários pontos do município. Ele lembra que enquanto os novos empreendimentos inflam a população na região, a infraestrutura permanece a mesma.
“Os prédios criam um adensamento. Você tem um aumento no volume de veículos num sistema viário já caótico e sem nenhuma perspectiva de melhora à curto prazo. Parece que a cada dia temos que sair de casa 10 minutos mais cedo” queixa-se.
Ainda assim, Niterói lidera as pesquisas de qualidade de vida e figura em terceiro lugar na lista de cidades com maiores Índices de Desenvolvimento Humano(IDH) do Brasil, de acordo com o Censo 2010. Isto porque o índice tem como critérios, indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula), longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB per capita). Não leva em consideração infraestrutura, serviços ou até mesmo o estresse da população.
Transporte ineficiente
De acordo com o engenheiro civil e especialista em transportes da Universidade Federal Fluminense(UFF), Gilberto Gonçalves, a atual política pública de incentivar compra e utilização de veículos próprios, em vez de investir em alternativas de transporte público é uma das razões para os problemas no trânsito.
"Construir mais prédios numa determinada região é apenas a gota d'água. O problema maior é que em Niterói não há investimentos em transporte público. Você tem que construir prédios sim, mas é preciso resolver os problemas de transporte", adverte.
O doutor em engenharia de transportes da UFF, Walber Paschoal, bate na mesma tecla e minimiza os problemas causados pela verticalização na cidade. Ele insiste em responsabilizar os problemas de trânsito e de mobilidade à falta de um transporte de massa eficiente.
“O transporte público de qualidade tem capacidade de atrair a demanda e convencer o usuário a deixar o carro. Niterói precisa de maiores investimentos, buscar outras soluções como metrô, monotrilho, expansão das barcas”
Segundo Paschoal, ampliar as rotas das barcas até São Gonçalo seria algo viável e altamente eficiente para desafogar o trânsito em Niterói: “Bastaria fazer a dragagem, e você consegue transportar mais de mil passageiros a cada 15 minutos”.
Ele explica que o Plano Diretor é responsável por prever a verticalização de determinada área e como a infraestrutura de transportes irá absorver a nova demanda. O engenheiro lembra, no entanto, que muitas vezes esta infraestrutura vem como solução depois que o problema ocorre.
“Talvez por falta de investimento, aqui os problemas acontecem antes, para depois ser buscada uma solução”.
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