27/10/2016
- Valor Econômico
A Petrobras
anunciou uma nova política de preços do diesel e da gasolina. A política
baseia-se em dois fatores: na paridade com os preços do mercado internacional e
na margem praticada para remunerar riscos inerentes à operação. A empresa
pretende ainda reavaliar mensalmente o preço dos combustíveis considerando a
tendência do mercado internacional, podendo ocasionar manutenção, redução ou
aumento nos preços praticados nas refinarias.
O preço que o
consumidor final observa na bomba é diferente do preço da refinaria. Essa
diferença dependerá de repasses feitos por outros integrantes da cadeia de
petróleo, especialmente distribuidoras e postos de combustíveis. Projeções da
companhia apontam que, se o ajuste feito for integralmente repassado ao
consumidor, o diesel e a gasolina cairiam respectivamente em 1,8% (cerca de R$
0,05 por litro) e 1,4% (R$ 0,05 por litro).
Os preços desses
combustíveis impactam toda a cadeia de transportes. A gasolina é o principal
combustível dos carros e motos - veículos utilizados no transporte individual
motorizado, que representam 31% dos deslocamentos nas cidades. O diesel, por
sua vez, é o principal combustível usado no transporte rodoviário de cargas,
representando 61% do total de cargas transportadas, e em ônibus, que é o modo
de transporte responsável por 25% de todos os deslocamentos nas cidades.
Destaca-se que o peso do combustível nos custos das empresas de ônibus é de
aproximadamente 20%.
É possível
esperar, portanto, que a medida anunciada tenha impactos relevantes na dinâmica
de preços do setor. A revisão do preço do diesel deve acarretar uma queda de
0,28% no valor da tarifa de ônibus, um bom resultado em todos os aspectos. Já a
variação da gasolina, em especial, tem dois efeitos. Por um lado, a queda do
preço pressiona para baixo a inflação; por outro, o barateamento do uso do
carro pode gerar um efeito negativo que é o incentivo ao uso do transporte
individual em detrimento do coletivo. Um indivíduo que troca o transporte
coletivo pelo transporte individual (carro próprio) contribui para o aumento da
poluição e do congestionamento nas vias públicas, entre outras externalidades
negativas.
A teoria econômica
sugere que as atividades que gerem externalidades negativas devem ser
tributadas, como forma de colocar sobre os seus usuários o ônus dos efeitos
gerados para toda a comunidade. No caso do setor de transportes, deve-se então
tributar o uso do transporte individual e subsidiar o coletivo.
Operacionalmente, essa medida poderia ser implementada por meio do aumento da
Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre a gasolina,
destinando-se as receitas adicionais arrecadadas para reduzir (subsidiar) a
tarifa do transporte coletivo. Nesse sentido, trata-se de um subsídio cruzado
do transporte individual em favor do transporte coletivo.
Uma proposta
complementar à nova política de preços do diesel e da gasolina em linha com o
que é sugerido pela teoria econômica seria aumentar o valor da Cide somente
sobre a gasolina em valor proporcional à queda do preço anunciada. O recurso
arrecadado seria transferido para subsidiar a tarifa do transporte coletivo. Em
linhas gerais, enquanto a política adotada melhora a vida de quem usa transporte
individual, mantendo inalterada a situação do passageiro de transporte
coletivo, a política alternativa tem lógica inversa, mantendo inalterada a
situação do consumidor de transporte individual e melhorando para o passageiro
do transporte coletivo.
O resultado
macroeconômico sobre a inflação da proposta alternativa também é mais atraente.
A aplicação do subsídio-cruzado poderia causar até R$ 0,11 de alívio no valor
das tarifas de ônibus urbano (considerando uma tarifa média nacional de R$
3,47), ocasionando desinflação de 0,08%, medida pelo IPCA. Como o peso da
gasolina no IPCA é de 3,89%, a redução do preço da gasolina anunciada pela
Petrobras gera um impacto inflacionário esperado de -0,05% (-1,4% x 3,89%); ou
seja, sob a ótica do principal índice de preços da economia, a política
alternativa de incentivo ao transporte coletivo tem melhores resultados
desinflacionários. Por fim, destaca-se que a política de desonerar o transporte
coletivo por meio de um imposto sobre a gasolina ainda aumenta o bem-estar das
famílias de mais baixa renda, que são os principais usuários do serviço.
A construção de
novas infraestruturas de transporte urbano, como ampliação da cobertura de
trens e metrô ou novos viadutos e túneis, demanda investimentos de grande porte
e normalmente com financiamento público, cenário improvável na atual conjuntura
de crise econômica e fiscal. A urgente melhora da mobilidade urbana nas grandes
cidades depende então do uso da infraestrutura atual com mais eficiência.
Uma estratégia
seria otimizar o uso do espaço, priorizando modos que ocupem menor espaço
relativo nas vias e emitam menos poluentes. Sinal de preços adequado é uma das
soluções, mas não pode ser a única. Uma segunda estratégia também necessária é
melhorar a eficiência operacional do serviço prestado, atraindo o usuário do
transporte individual oferecendo um serviço com mais conforto, rapidez e
confiabilidade.
Samuel Pessôa é
pesquisador associado de Economia Aplicada do FGV/Ibre Edmilson de Siqueira
Varejão é pesquisador do FGV/CERI.
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